Seleção de coisas

O desbaste da bananeira é uma prática de cultivo utilizada para assegurar a produtividade das plantações de banana em várias regiões do sul, entre elas o Peru e o Brasil. Com o crescimento das novas raízes da árvore e a chegada à superfície, a pessoa encarregada do cultivo realiza uma seleção das ramas – as “filhas” – com maior possibilidade de crescer e dar frutos. Aquelas que não cumprem os requisitos para assegurar uma ótima colheita são eliminadas a partir do corte da gema do crescimento, evitando que ela nasça novamente. O corte ocorre de dentro para fora, para não ferir a árvore-mãe, e logo se cobre a parte cortada. As que permanecem são cortadas de maneira que as ramas tenham a forma correta que permita um crescimento ascendente da árvore.

Esse mecanismo de seleção, mais do que a produção de banana, poderia ser semelhante a outros processos mais ligados ao nosso trabalho diário. Nossa mente se encarrega, com o passar do tempo, consciente e inconscientemente, de eleger quais experiências devem ser mantidas e quais devem ser deixadas para trás; é uma seleção que implica também um processo de descarte. Neste sentido, resgatar as memórias “desfiliadas” significa tomar outras direções. Significa apreender o mundo redesenhando aquilo que nos apresenta poucas pistas, questionando a história linear, racional, de como nos relacionamos e nos adaptamos com o tempo.

Nydia Negromonte decide ir por esses caminhos. As repetições das lembranças – sempre um pouco difusas – com objetos cotidianos ao fundo nas fotografias de seu arquivo familiar se conectam com ela, gerando novos sentidos. O real se apresenta mais no momento da sincronia que em qualquer outro tempo ou lugar: fotografias de lugares longínquos na memória, objetos encontrados utilizados em algum outro lugar, em algum outro momento, cheiros, sabores, histórias que ressoam. Mesmo assim, instalações criadas a partir de elementos naturais ou imagens que remetam a eles – água, terra, ar – criam novas formas de entender o significado de brotar, crescer, adaptar-se. São obras e corpos resilientes, que, ao se encontrarem com um ambiente incerto, produzem espaços favoráveis para seu desenvolvimento a partir de novas conexões, gerando microclimas, relações e comunidades de crescimento.

As obras selecionadas para esta exposição são pistas de uma rota que é marcada pela repetição; nelas, se dão as mesmas coincidências uma e outra vez. Esses encontros assertivos são o que guia Nydia – que volta à nossa cidade depois de 20 anos – na pesquisa contracorrente, instintiva, sensorial, de novas maneiras de entender sua própria história e de se conectar com lugares comuns. São objetos feitos tanto em sua casa, oficina, ou para espaços específicos em diferentes cidades do Brasil. Muitas delas – peças colaborativas elaboradas com a participação de amigos – hoje são reconstruídas para gerar novas relações e compartilhar experiências em uma cidade que tem sido constantemente redesenhada em sua memória. Em contato com a umidade de Lima, novas reações chegarão, mais coincidências, outras formas de crescimento.

Escrito por Andrea Elera Coelho Em 2018